Um verde luar

Posted: | Por Felipe Voigt | Marcadores:

São quatro horas da manhã e agora você dorme. Certamente a vela do teu sono se apagou há algumas horas. O meu dia está longe de terminar ou de começar. Nunca sei ao certo quando um termina para o outro começar.

Ainda há pouco estava pela rua, vagando sozinho em busca de ar. Na noite vazia em busca de abrigo. Tentando uma forma de em você me reencontrar. Tracei rumos, pensei em histórias, apaguei ideias, me perdi novamente tentando te buscar.

Quando cansei, voltei para casa. Mas antes de no carro entrar, parei por uns minutos olhando para o céu. Algo estava ali a me observar. Parecia que sabia o que ainda não sei. Sentia o que há muito ressinto. Foi quando nessa troca, um sorriso me fez entender o que eu estava a apreciar.

Voltei dirigindo em silêncio, não liguei o rádio. Não abri os vidros. Deixei apenas o silêncio daquela luz me guiar de volta. Lá estava, alto no céu, como se tivesse saído hoje apenas para exigir contemplação. Muitas vezes, todas as vezes, esteve por ali. Mas hoje apenas queria a contemplação.

Esteve sempre tão claro e já transformei isso algumas vezes em poemas. Talvez devesse novamente poemar. Mas não quis. Apenas preferi te escrever para te explicar aquilo que foi me passado há pouco. Não quero rimas, não pretendo romantizar as linhas. Logo mais estará acordada para a semana começar e não terá tempo de lirismo se banhar. Pela manhã, a urgência da vida cobra uma praticidade esmagadora. Não há tempo para sentir, apenas para sobreviver e pensar.

Mas talvez haja tempo. Alguns minutos desse seu dia incerto. E em um leve piscar entenderá o que digo. Pois foi assim que me foi gritado, berrado, escancarado ao sair há pouco para respirar: 

Enquanto a Lua é você, o luar é teu olhar.

Há dias em que o luar está diferente do seu habitual. Está simples, está normalizado. Saímos pela noite e o vemos ali, sem a necessidade de o contemplar. Sabemos que ilumina todo o céu, na penumbra até percebemos as sobras causadas por ele. Mas não foi criado com esse propósito. O luar precisa ser admirado e contemplado a cada mudança de posição.

Assim é o teu olhar. Em dias conturbados, ele se nubla. Aparenta uma normalidade que não é inerente a ele. Apenas está a cumprir o ciclo do calendário, deixando o virar das folhas abrir e fechar suas pálpebras feito nuvens. Mas não foi esse o propósito do seu olhar ter sido criado.

Não...

Esses olhos verdes são capazes de fazer com que eu me reapaixone como me reapaixonei pela Lua agora. Novamente. Outra vez. De novo. É parar para por longos momentos e apenas fazer isso: ver, olhar, analisar, se perder, se encontrar.

Mesmo quando o céu não está enluarado. Um céu enegrecido é um céu com saudade do teu olhar. Teu olhar é o luar dos que te contemplam. Traz conforto, traz alento, acalanta todo o meu sofrimento.

Tantas foram as vezes que me vi nessa situação como esta de agora e apenas deixei a poesia de te amar me dominar. Tantas outras foram as vezes em que vi esse mesmo luar invadir meu quarto e se deitar em minha cama e apenas me coloquei a observar para depois escrever. Não queria deixar de perpetuar aqueles momentos, assim como não quero deixar morrer esse luar que agora o mundo perde enquanto eu o ganho.

Luar que agora se esconde atrás desse prédio em construção que me ladeia. De tanto elogiá-la apenas em um contemplar, se ruborizou e apenas sorri tímida enquanto escrevo. Feito você quando elogiada, que se enrubesce e se esconde na fina garoa da ironia.

Deveria ter feito disso um poema, mas não saberia como traduzir o que agora sinto ao me ser revelado tal segredo. Por isso apenas escrevi para te contar. Siga dormindo e acorde amanhã sabendo que seu olhar é a joia que a Lua ganhou para ostentar tal qual a mais narniana das relvas, os mais bem forjados brincos, uma herança dos céus para os mortais que possuírem o privilégio de contemplá-los enquanto viver.

Seus olhos são o luar da Lua, o único que ela pode realmente contemplar. Os mantenha sempre iluminados, assim a Lua seguirá devolvendo espetáculos como o de hoje. Ela merece ser recompensada.

E eu no meio, banhado pelas duas.
Pois você é minha Lua e seu olhar é o meu luar.

1 comentários:

  1. Anônimo disse...
  2. Se é o meu para você, toda vez que a vejo é o seu para mim...
    Talvez a lua seja apenas uma prova de que ago tão grande, tão magnifico está perto, está ali, mesmo não vendo a gente sente e segue assim.

    Obrigada.

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