Preciso voltar pra cozinha

Posted: | Por Felipe Voigt | Marcadores:

Não é isso o que estamos sempre buscando? Compreender o amor vivido, sentir o amor recebido, aprender a como viver sem o amor preterido, aprender a viver com o amor chegado, renegar o amor projetado, pleitear o amor impossível, esquecer um amor almejado, querer de volta um amor já amado?

Esqueça aqueles que não sabem viver para morrer de amor. Eles não nos entendem. A eles estão reservadas as superfícies dos sentimentos. Mas nós, que nos afogamos em busca de algo que nos faça sentir a leveza de respirar alguém, vivemos para isso: para amar, para morrer de amor e não querer matar ninguém com isso. Os outros apenas não sabem. E como são infelizes em suas felicidades os coitados que desconhecem o quão gostoso é viver assim.

Queremos a personificação daquela pessoa que passamos a vida imaginando, onde tentamos repetidas vezes encaixar qualquer outro alguém ali e apenas quebramos nossos conceitos, remodelamos nossos padrões e sempre faltava algo que encaixasse. Como numa culinária adaptada, aceitamos o que estávamos cozinhando, deixando a fôrma de lado e comendo aquilo que não saciava a fome nem nutria a alma. Mas faltava o tempero da exceção, a cobertura do que é tão óbvio internamente mas que ninguém sabia como decorar.

Cada nova paixão era uma fornada a mais e uma fome a menos.

Mas faltava algo, sempre faltou, não? E mesmo assim, nos sentávamos nas mesmas mesas que os outros, pedíamos o mesmo cardápio e sorriamos mesmo quando a vontade era sair gritando desse restaurante que a vida nos abriu. Jogar fora os velhos talheres, puxar a mesa e rasgar a toalha certinha e padronizada. O que queríamos mesmo era um balcão e uma cerveja pra acompanhar qualquer petisco incerto que saciasse aquela fome que nunca se saciava.

Hoje parece aumentar o número de saciados. Os que se levantam satisfeitos pela manhã e se contentam com os lanches que come por aí, fora de casa, para voltar e comer aquilo que sacia sua ausência de sentimento visceral. Mas nós não somos assim.

Se você ainda está nessa insana corrida, desista. Simplesmente desista de encontrar alguém. Tenha como certo a desistência do tentar, esqueça as projeções, assuma os fracassos, olhe para o mundo como um cardápio refinado e sujo e que nunca irá te dar vontade de abocanhar como se não houvesse indigestão amanhã. O hoje já está indigesto, portanto desista e aceite.

Somente quando realmente desistir é que conseguirá encontrar alguém.

Foi assim comigo. Deixei de esperar, cansei de ter fome e passei apenas a me alimentar para me manter sobrevivido. Não via mais esperanças apesar de esperá-las. Nunca chegavam. Apenas a fome doía, a vontade de engolir a vida passava a cada ronco do meu choro em minha barriga e a cada lambida das lágrimas em meu rosto cansado.

A fome já me fez chorar muito. Chorei a fome de alguém que não existia ainda, a fome de devorar e ser devorado, sentindo o abocanhar descrédulo deixando um pedaço enorme faltando cada vez que a saudade de alguém que não existia nos engolia - a mim e a ela - de volta.

Então te recomendo: desista. Aceite a derrota. A vida te venceu pelo cansaço.
É isso. Pronto, acabou, não há mais nada além disso. Certo?

Só assim realmente conseguirá achar a tua fôrma ideal. Desidealizada, inesperada, impreterida, encaixada em todos os conceitos que voltará a criar e pleitear. Você precisa se livrar de tudo o que acreditou um dia não merecer... para começar a merecê-los e a tê-los e a aceitá-los.

No final, a gente poderá até não entender ou compreender que é o amor, mas saberemos matar a fome que nos mata e ainda assim não saciá-la, sabendo que teremos suprimentos suficientes para nos manter vivos e nutridos e - por que não? - amados.



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