Putaria comovente

Esse virar das horas me entedia,
me cansa, me irrita, honestamente.
Cotidiano é uma injeção de anestesia.

Cá estou debruçado sobre a pia
lavando meu rosto novamente.
Como antes, a água ainda é fria.

A vida é uma legítima e digna vadia
de falácia íntima e eloqüente
que quase sempre nunca me sacia.

Ela me chupa, me fode e ao fim, enfia
suas presas no meu membro latente.
Castrado pela vida, logo eu, quem diria.

Ainda sinto aquela silenciosa gritaria
em meu respirar cansado e decadente.
Berros que a dor de viver me propicia.

Mesmo quando entregue à boemia.
O álcool é só mais um confidente
daquelas horas que até a alma atrofia.

Viver sem isso é uma irresistível utopia
que para muitos se torna bem atraente
Felizes os que sonham morrer sem agonia.

Mas sonhos se dissipam na ventania
criada pela realidade inconsistente.
É como ser fiel em meio a uma orgia.

Enquanto sobrevivo à desarmonia
e respiro quase que impotente,
destilo o resto de minha ironia.

Sigo escrevendo toda essa porcaria
mesmo achando tudo tão prepotente.
Uma fraca e descabida pseudofilosofia.

E se em ti essa coisa também não esfria
seja bem-vindo, camarada indigente:
és mais um membro do clube da melancolia.