O pavio de um beijo

Posted: | Por Felipe Voigt | Marcadores:
Enquanto pingos reluziam e abafavam a luz que se aquecia nos postes
E se esgueirava por entre as folhas das árvores molhadas, o mundo parava
Em torno daquilo que sempre foi o condutor da convergência de essências passadas
Lutando contra o inelutável destino da não cessão do não definitivo

Enquanto carros parados esfriavam a rua que se banhava pela enxurrada cerceante
De passos apressados de corpos que buscam abrigo dos pingos
O relógio se armava contra o tempo disponível aos abrigados e molhados sem perigo

As risadas dos transeuntes que paravam nas calçadas e se jubilavam
Em torno de copos e garrafas e mesas e cadeiras,
O silêncio as lavou em cumplicidade aos ouvidos que nada mais ouviam
a não ser o bater da inevitável sensação causada e buscada e resgatada

Passaram-se horas esperando aquele canto
Passaram-se meses aguardando aquele encanto
Viraram-se segundos consumados em instantes
Deixaram-se certezas enterradas sob dúvidas
Seguiram-se vidas sem definirem quais seus rumos

Os olhos se fecham às mãos nos ombros drenando o fardo fadado a pesar
Sobre quem se refugia nas próprias sombras e descarrega sonhos e desejos disformes

As mãos à face resgatam o os olhos mareados reclusos
O brilho se faz arder na inocência do medo da perda do controle
Daquilo que já não se controla e nem se nega e nem se comporta e nem se espera

Desse medo, fez-se a coragem; daquela vontade, se fez a ação;
As bocas entreabertas se tocaram em sintonia,
Contrastando com o desafino da respiração

Um pedido de uma declaração feita quase sussurrada e encarada
Acendeu-se, então, a rua e parou a chuva que já não mais molhava porque não importava

Enquanto os carros se separam após os corpos se separem, cada um voltando
Para onde deveria, mas não gostaria de estar sem a companhia daquele que se foi
Refazendo momentos, repensando desejos, transformando tudo novamente
Com a velha bomba pulsando forte e consternando o caminho conhecido de sempre

No leito, já refeitos dos goles tomados e dos pingos recebidos e no rodar do relógio
Nas pequenas mãos surgiu o gozo rápido, das grandes mãos nasceu de volta a poesia
Causados por segundos de intensa lembrança de algo julgado adormecido
E que fora novamente despertado sem nunca ter inexistido ou esquecido
Mas que precisa ser enganado e disfarçado para que os eixos não se colidam
Desenlaçando o inevitável destino de coexistência à distância de um peito

No orgasmo da poesia, no gozo das palavras, cada um ama por onde pode
Existem beijos que deveriam ser chamados de beijo pavio
E o efeito da explosão só impacta aos que conseguem se impactar ainda
Com a pequena beleza triste de um amor que faz sofrer ao tirar todo sofrimento

1 comentários:

  1. Anônimo disse...
  2. Bem assim...

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