Prefeitura X Moradores

Posted: | Por Felipe Voigt |
O casal Luís Cláudio Vieira e Cleusa Ferreira de Sousa mora em uma casa no Jardim Eldorado com uma filha pequena e outras duas pessoas. A doméstica Dalva de Sousa mora sozinha no mesmo bairro com três filhos, uma adolescente de 16 anos e duas crianças de 5 e 3 anos. As coincidências entre esses dois casos vão além do local onde moram. Eles fazem parte de um grupo de nove famílias que estão sendo ameaçados de despejo pela Prefeitura de Cordeirópolis.

Para entender a situação, é necessário explicar o que aconteceu: em 2002, três famílias ocuparam uma área da Fepasa e começaram a construir barracos no local, próximo a linha do trem. Devido a falta de segurança e a necessidade de se resolver a situação, o departamento de Promoção Social na época resolveu alugar, em caráter emergencial, casas para que as famílias pudessem morar até que tivessem condições de comprar uma casa própria ou bancar o aluguel do próprio bolso. O mesmo foi feito em outros seis casos.
No ano passado, o prefeito Carlos Tamiazo (PPS) chegou a assinar a prorrogação desses contratos emergenciais, estendendo o prazo de utilização das casas até o final do ano passado. Mas desde o primeiro dia de 2006, essas famílias passaram a receber uma notificação para que desocupassem o imóvel em até trinta dias, correndo o risco de serem expulsas judicialmente.
E é aqui que começa o problema. Os personagens citados no começo dessa matéria são um exemplo das famílias que a Prefeitura está querendo despejar na rua. A desempregada Cleuza sofreu um derrame parcial no ano passado e está impossibilitada de trabalhar. Seu marido, Luis Cláudio, recebe um salário mínimo como ceramista, mas gasta R$ 100 todos os meses com remédios para a esposa. Antes de sofrer o derrame, ela trabalhava no projeto Cata-Lata, mas até agora não recebeu nenhum direito trabalhista da Prefeitura. Ambos moram em Cordeirópolis há 15 anos e votam na cidade. Ou seja, não estão de passagem e precisam de mais atenção do poder público.

Descaso
A doméstica Dalva lamenta a falta de diálogo com o departamento de Promoção Social. "Somos tratados como cachorros. Desdenham do nosso problema e não nos dão atenção nenhuma", lamenta. Ela diz também que não se recorda de ter visto o prefeito pelo bairro depois que foi eleito. "A impressão que passa é que ele não gosta de pobre. Nunca mais foi ao bairro e sequer nos recebe no gabinete".
O que Dalva quer é o mesmo que Cleuza, Luis Cláudio e as outras famílias: condições dignas de moradia, sem depender financeiramente da Prefeitura. "Não queremos nada de graça. Só queremos a garantia de que, ao sairmos das casas, nossas crianças não fiquem nas ruas ou embaixo da ponte. Essa parece ser a única saída", garante Luís Cláudio.
Eles vão mais além: "se nos obrigarem a sair, seremos obrigados a ocupar uma outra área. Não porque queremos, mas porque precisamos. Ou então vamos dormir em frente a casa do prefeito. Quem sabe assim ele nos recebe". Outro problema detectado está no fornecimento de cestas básicas. Mais de uma família já deixou de receber o benefício. Aparentemente, sem qualquer motivo.

Outro lado
A responsável pelo departamento de Promoção Social, Maria Aparecida Bragotto de Castro Wolf, não foi encontrada na tarde de sexta-feira para comentar o assunto. Através da Assessoria de Imprensa da Prefeitura, foi informado que na segunda-feira seria marcada uma reunião com nossa equipe de reportagem.
Na notificação de despejo, não há nenhuma informação que esclareça o motivo de tal ação. Apenas afirma que "não há interesse na renovação do contrato" e que "o Poder Público não pode, por lei, estender indefinidamente, um benefício que foi concedido em caráter emergencial".

Opinião
Infelizmente, essa situação merece e requer um pouco mais de atenção por parte dos Poderes Públicos. O Executivo, o Legislativo e o Judiciário não podem virar o rosto para um problema de tal importância. A questão da promoção social está ligada diretamente com a qualidade de vida da cidade.
Quando não há condições de moradia para as famílias mais carentes, há, inevitavelmente, um problema de segurança pública. Isso porque, no desespero, algumas pessoas podem adotar medidas mais dramáticas para conterem suas necessidades.

Isso não quer dizer que essas pessoas despejadas sejam criminosos em potencial. Pelo contrário, são pessoas dignas que estão buscando uma solução pacífica para continuarem a viver. Mas, em uma eventual formação das chamadas "favelas", isso acaba atraído os criminosos de passagem pela cidade, estimulando sua permanência no município e, assim, levando-os a praticarem roubos com mais freqüência. Sem mencionar que as famílias sérias, que estão ali contra a vontade, sofram nas mãos desses criminosos, já que o tráfico de drogas costuma ser comum. Qual a tranqüilidade, então, de Luis Cláudio, Cleuza e Dalva em criar seus filhos em um ambiente desses?
Tudo o que essas famílias precisam é de mais tempo. Pode parecer muito, mas quatro anos não são suficientes para, quando se está quase na miséria, conquistar um emprego que pague bem, criar os filhos, sustentar uma casa e ainda sobrar dinheiro para o aluguel. Seria necessário que a Prefeitura adiasse a decisão de despejar as famílias até que fosse possível disponibilizar moradias populares a elas.
Essa não é apenas a opinião da TRIBUNA. É a opinião de qualquer pessoa sensata, que ocupe um cargo público e que tenha R$ 50 milhões de orçamento em mãos. É preciso olhas nos olhos do povo.

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